quarta-feira, outubro 01, 2003

É, Drummond...

É, meu velho, vai chegando seu aniversário e você vai colocando as manguinhas de fora. O que será dessa vez? Vai soltar a bruxa como no seu centenário me fazendo sentir completamente só?
Quem vai embora dessa vez? A quem vou ter que pedir em vão para que não se afaste, não se afaste muito?
.
E agora, Drummond, o que me aguarda?
Será que mandou "A Bruxa" me assombrar como castigo por ter feito, no ano passado, essa brincadeira com seu poema:

E agora, Maria?
O Salto quebrou,
O cartão de crédito estourou,
O povo sumiu,
A meia desfiou.
E agora, Maria?
E agora, Você?
Que tem mil sobrenomes,
Que esnoba os outros,
Mas não paga o que deve,
não ama, não pensa.
E agora, Maria?
Está sem celular,
Está sem dinheiro,
Está sem seu carro,
já não pode beber,
já não pode cheirar,
unzinho já não pode,
a noite esfriou,
seu casaco furou,
o dia não veio,
o táxi não parou.
Não veio a carona,
e a escova desmontou,
E agora, Maria?
Sua lipo,
Sua unha,
Seus remédios pra emagrecer,
Seu guarda-roupa não renovado,
Sua intolerância,
Seu parque de diversões - e agora?

Com a chave na mão
Quer abrir a porta,
Mas tá bêbada demais.
Quer ir a Maresias,
Mas ninguém te convidou.
Quer ir ao Shopping,
Mas o Shopping já fechou.
Maria, e agora?

Se você gritasse,
Se você gemesse,
Se você dançasse
A dança do Tigrão,
Se você dormisse,
Se você morresse...
Mas você não morre,
Você é uma instituição, Maria!

Sozinha no escuro,
qual caçador à caça
do próximo idiota,
Que pague suas contas,
Que a ofereça uma capa de revista
Pra aparecer nua,
Você espera, Maria.
Maria, o quê?

Juro que não acabo com seus poemas, nunca mais, meu velho. Foi só uma brincadeirinha inocente. Desculpa. Manda a bruxa sair daqui, vai... Sempre fomos tão amigos...

Nenhum comentário: